O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam
ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso
que me alegra, montão. E, outra coisa: o diabo, é às brutas; mas
Deus é traiçoeiro! Ah, uma beleza de traiçoeiro – dá gosto! A
força dele, quando quer – moço! – me dá o medo pavor! Deus
vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é na lei do mansinho –
assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se divertindo, se
economiza. A pois: um dia, num curtume, a faquinha minha que
eu tinha caiu dentro dum tanque, só caldo de casca de curtir,
barbatimão, angico, lá sei. – “Amanhã eu tiro...” – falei, comigo.
Porque era de noite, luz nenhuma eu não disputava. Ah, então,
saiba: no outro dia, cedo, a faca, o ferro dela, estava sido roído,
quase por metade, por aquela agüinha escura, toda quieta. Deixei,
para mais ver. Estala, espoleta! Sabe o que foi? Pois, nessa mesma
da tarde, aí: da faquinha só se achava o cabo... O cabo – por não
ser de frio metal, mas de chifre de galheiro. Aí está: Deus... Bem,
o senhor ouviu, o que ouviu sabe, o que sabe me entende...
ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso
que me alegra, montão. E, outra coisa: o diabo, é às brutas; mas
Deus é traiçoeiro! Ah, uma beleza de traiçoeiro – dá gosto! A
força dele, quando quer – moço! – me dá o medo pavor! Deus
vem vindo: ninguém não vê. Ele faz é na lei do mansinho –
assim é o milagre. E Deus ataca bonito, se divertindo, se
economiza. A pois: um dia, num curtume, a faquinha minha que
eu tinha caiu dentro dum tanque, só caldo de casca de curtir,
barbatimão, angico, lá sei. – “Amanhã eu tiro...” – falei, comigo.
Porque era de noite, luz nenhuma eu não disputava. Ah, então,
saiba: no outro dia, cedo, a faca, o ferro dela, estava sido roído,
quase por metade, por aquela agüinha escura, toda quieta. Deixei,
para mais ver. Estala, espoleta! Sabe o que foi? Pois, nessa mesma
da tarde, aí: da faquinha só se achava o cabo... O cabo – por não
ser de frio metal, mas de chifre de galheiro. Aí está: Deus... Bem,
o senhor ouviu, o que ouviu sabe, o que sabe me entende...
ROSA, Guimarães João. Grande sertão: veredas. (1994, pp. 24-25).