Santo
Agostinho (354-430), bispo de Hipona (norte de África), doutor da Igreja
Sermão
293,3, para a natividade de São João Baptista; PL 38, 1327 (trad. bréviário 3.º
dom. Advento, rev.)
Reconhecer
a voz; reconhecer a Palavra
É
difícil não confundir a palavra com a voz; foi por isso que tomaram João como o
Messias: a voz foi confundida com a Palavra. Mas a voz reconheceu-se a si mesma
como tal, para não lesar a Palavra, e disse: «Não sou Cristo, nem Elias, nem o
profeta.» Quando lhe perguntaram: «Então quem és?», respondeu: «Eu sou a voz do
que clama no deserto» (Jo 1,23). [...]
Ele é a
voz de quem quebra o silêncio: «Preparai o caminho do Senhor», como se
dissesse: «Sou a voz que se faz ouvir apenas para introduzir a Palavra no vosso
coração; mas esta não se dignará entrar onde pretendo introduzi-la se não lhe
preparardes o caminho.» E que quer dizer «Preparai o caminho», senão: «Suplicai
insistentemente»? Que quer dizer «Preparai o caminho», senão: «Sede humildes de
coração»?
Imitai
o exemplo de humildade de João Baptista. Consideram-no o Messias, mas ele
responde que não é o que julgam; não se aproveita do erro alheio para uma
afirmação pessoal. Se houvesse dito: «Eu sou o Messias», facilmente teriam
acreditado na sua palavra, pois já o tinham como tal antes de ele o haver dito.
Mas não disse, antes reconheceu o que era e disse o que não era: foi humilde.
Compreendeu donde lhe vinha a salvação; compreendeu que não era mais que uma tocha
ardente e luminosa, e receou que o vento da soberba pudesse apagá-la.