Quanto Mais se Ama a Humanidade, Menos se Ama o Indivíduo em Particular
(...) É exatamente o que me contava, há muito tempo, aliás, um médico — observou o stariéts. — Era um homem de idade madura e verdadeiramente inteligente, exprimia-se tão francamente como a senhora, se bem que brincando, mas com tristeza. “Eu amo — dizia ele — a humanidade, mas admiro-me de mim mesmo. Tanto mais amo a humanidade em geral, quanto menos amo as pessoas em particular, como indivíduos. Muitas vezes tenho sonhado apaixonadamente em servir à humanidade, e talvez tivesse verdadeiramente subido ao calvário por meus semelhantes, se tivesse sido preciso, muito embora não possa viver com ninguém dois dias no mesmo quarto. Sei-o por experiência. Desde que alguém está junto de mim, sua personalidade oprime meu amor-próprio e constrange minha liberdade. Em vinte e quatro horas, posso mesmo antipatizar com as melhores pessoas: uma, porque fica muito tempo na mesa, outra, porque está resfriada e só faz respirar. Torno-me o inimigo dos homens, apenas se acham eles em contato comigo! Em compensação, quanto mais detesto as pessoas em particular, tanto mais ardo de amor pela humanidade em geral.
— Fiódor Dostoiévski, in Os Irmãos Karamazov - pág 538, ed. Nova Aguilar.