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70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos por Edson Lira, advogado

Em 10 de dezembro de 2018, a Declaração Universal
dos Direitos Humanos (DUDH), iniciativa da
Organização das Nações Unidas...


Declaração de 1948 e a concepção contemporânea dos direitos humanos



A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada na Assembleia Geral das Nações Unidas no dia 10 de dezembro de 1948, dia considerado como dia internacional dos direitos humanos no calendário civil.  Tal Declaração, matriz do Direito Internacional dos Direitos Humanos, traz no seu bojo uma base axiológica a ser considerada por povos e nações. A terra firme do continente axiológico da dignidade da pessoa humana e a negação da sua descartabilidade, elementos não só pertinentes à Declaração mas sobretudo relevantes.

Em 1948 é adotada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela aprovação unânime de 48 Estados, com oito abstenções. A inexistência de qualquer questionamento ou reserva feita pelos Estados aos princípios da Declaração e a inexistência de qualquer contrário às suas disposições, conferem à Declaração Universal o significado de um código e plataforma comum de ação. A Declaração consolida a afirmação de um ética universal, ao consagrar um consenso sobre valores de cunho universal, a serem seguidos pelos Estados. (Piovesan, 2012, p. 43-44).
           
A Declaração de 1948, no seu preâmbulo, afirma nitidamente que a Assembleia Geral das Nações Unidas proclama os direitos fundamentais. Dallari, 2009, p. 212, comenta:

É bem expressivo esse termo, pois torna evidente que não há concessão ou reconhecimento dos direitos, mas proclamação deles, significando que sua existência independe de qualquer vontade ou formalidade.
[...]                             
Indo muito além da simples preocupação com a conservação de direitos, a Declaração faz a enumeração dos direitos fundamentais e, no artigo 22, proclama que todo ser humano tem direito à segurança social e à realização dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade. O exame dos artigos da Declaração revela que ela consagrou três objetivos fundamentais: a certeza dos direitos, exigindo que haja uma fixação prévia e clara dos direitos e deveres, para que os indivíduos possam gozar dos direitos ou sofrer imposições; a segurança dos direitos, impondo uma série de normas tendentes a garantir que, em qualquer  circunstância, os direitos fundamentais serão respeitados; a possibilidade dos direitos, exigindo que se procure assegurar a todos os indivíduos os meios necessários à fruição dos direitos, não se permanecendo no formalismo cínico e mentiroso da afirmação de igualdade de direitos onde grande parte do povo vive em condições subumanas.
           
Piovesan( 2012, p. 44) afirma que a  concepção contemporânea de direitos humanos tem o seu começo na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Salienta a autora que tal concepção é marcada pela universalidade e indivisibilidade desses direitos. No tocante à indivisibilidade apresenta ela a situação inédita: a conjugação do catálogo dos direitos civis e políticos com o dos direitos econômicos, sociais e culturais. Assim, a Declaração surpreendetemente aproxima o discurso liberal do discurso social da cidadania. O valor da liberdade une-se ao valor da igualdade, arremata a autora.
            Nesse mesmo sentido,

A Declaração de 1948 inovou, ainda, ao introduzir elementos que passariam a caracterizar a concepção atual de direitos humanos, como a universalidade, a indivisibilidade e a interdependência [...]. Por agora importa salientar que a Declaração foi o primeiro documento internacional a tratar dos direitos humanos, tanto civis e políticos quanto econômicos, sociais e culturais, de maneira indivisìvel,ainda que reconhecendo sua distinta natureza jurídica (Weiss, 2012, p.84).
           
Em suma, a Declaração Universal dos Direitos Humanos constitui-se o lastro axiológico para a visão da indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos.

Os direitos humanos constituem uma unidade indivisível e interdependente

Insofismavelmente, os direitos humanos não podem ser compreendidos só do ponto de vista das liberdades individuais, os direitos individuais buscados e que se constituíram a bandeira de luta das revoluções burguesas. 
Há uma inviabilidade nos direitos humanos, se houver divórcio entre direitos civis e políticos e direitos sociais, econômicos.
Piovesan (  2012, p. 208-2010) reafirma que com a visão integral e não fragmentária, portanto, dos direitos humanos, visão essa ventilada no texto da Declaração, chega-se à concepção contemporânea de direitos humanos. Que visão é essa? Direitos humanos concebidos como uma unidade interdependente e indivisível. Acolhe-se, nessa compreensão contemporânea, portanto, a ideia daa expansão, acumulação e fortalecimento dos direitos humanos, todos são essencialmente complementares e em constante dinâmica de interação. Nessa nova compreensão, os direitos humanos, unidade indivisível,  resta sem sentido o direito à liberdade quando não garantido o direito à igualdade ou esvazia-se o direito à igualdade quando não assegurada a liberdade. Não só pode haver a abstenção estatal mas também a sua atuação. Requer-se um governo ativo, interventor no sentido do bem-estar econômico e social.
Impende dizer que, segundo Piovesan, sem a efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais, os direitos civis e políticos empobrecem e são reduzidos a mera afirmação formal e real negação. Sem respeito à liberdade, os direitos direitos econômicos, sociais e culturais carecem de verdadeira significação. Não se pode mais pensar liberdade sem justiça social, como também pensar a justiça social sem pensar na liberdade. Conclui Piovesan que todos os direitos humanos constituem um complexo integral, único e indivisível. Tal compreensão vê os direitos necessariamente inter-relacionados e interdependentes entre si.

Cabe realçar que, tanto os direitos sociais, econômicos e culturais, como os direitos civis e políticos, demandam do Estado prestações positivas e negativas, sendo equivocada e simplista a visão de que os direitos sociais, econômicos e culturais só demandariam prestações positivas, enquanto os direitos civis e políticos demandariam prestações negativas, ou a mera abstenção estatal. A título de exemplo, cabe indagar qual o custo do aparato de segurança, mediante o qual se asseguram direitos civis clássicos, como os direitos à liberdade e à propriedade, ou ainda qual o custo do aparato eleitoral, que viabiliza os direitos políticos, ou do aparato de justiça, que garante o direito ao acesso ao Judiciário. Isto é, os direitos civis e políticos não se restringem a demandar a mera omissão estatal, já que a sua implementação requer políticas públicas direcionadas,que contemplam também um custo (Piovesan, 2012, p. 244-245).
A Declaração de 1948 introduz a indivisibilidade dos direitos humanos, ao ineditamente conjugar o catálogo dos direitos civis e políticos com o dos direitos econômicos, sociais e culturais. Combina, assim, o discurso liberal e o discurso social da cidadania, conjugando o valor da liberdade com o valor da igualdade.
A visão compartimentalizada dos direitos humanos é nociva e perigosa e ainda, não corresponde à verdade histórica. Os direitos humanos são indivisíveis e interdependentes. Não se pode dizer que se tem liberdade sem educação, sem saúde, sem, enfim, uma vida digna. Para um direito ser efetivo demanda o atendimento de outros direitos. 
Edson Lira, advogado

Referências:

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos da teoria geral do Estado. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 13 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.


WEISS, Carlos. Direitos humanos contemporâneos. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2012..

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