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Da tutela provisória, conceitos, requisitos e diferenças

 

Da tutela provisória, conceitos, requisitos e diferenças

Edson Lira, advogado, OAB/AL 12658       

 

           

            A presente produção textual traz à tona uma reflexão acerca da tutela provisória. A tutela provisória vem ao encontro da necessidade de transpor obstáculos para a adequada entrega da prestação jurisdicional, a saber, a duração e o custo do processo. Assim sendo, a tutela provisória é a expressão do direito à tutela jurisdicional e visa a neutralizar os efeitos deletérios do tempo, não podendo servir de pretexto. A tutela provisória visa a equalizar o direito à tutela jurisdicional e o direito à duração razoável. Discorreremos sobre este importante tema. Conceitos, diferenças, requisitos, serão abordados com o escopo precípuo de adensar a compreensão.

            O Novo Código de Processo Civil destina o Livro V da Parte Geral ao tratamento da tutela provisória, dividida em tutela provisória de urgência (cautelar e antecipada) e de evidência.

            A rigor, o fundamento da tutela provisória, ao menos nos casos de urgência, poderia ser buscado no texto constitucional, uma vez que o art. 5º, inciso XXXV, determina que a lei não exclua da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão (princípio da inafastabilidade da jurisdição). Ora, para que esse princípio constitucional se torne efetivo, faz-se mister que o Judiciário também possa exorcizar eventual perigo ou ameaça que, em razão da demora no processo, o provimento jurisdicional possa sofrer.

            A título de observações preambulares, entendemos que a tutela é técnica processual e é provisória porque a decisão apoia-se no juízo de probabilidade. A vida é multifacetada. Não é monotonia, mas politonia e, nesse sentido, não pode ser enclausurada num padrão cartesiano. As tutelas provisórias inserem-se na dinâmica da sociabilidade, da vida como ela é. Nas tutelas em exame, há a sumariedade da cognição, diferente da tutela definitiva que é proferida com base em cognição exauriente. A lógica da tutela provisória é, portanto, a distribuição do ônus do tempo.

            O antônimo de provisório é o definitivo. Entre a tutela definitiva e a tutela provisória não existe diferença ontológica. A diferença entre elas é de grau de cognição.  O provisório é algo que precisa ser confirmado para se tornar definitivo. A tutela definitiva é aquela que não será substituída por nenhuma outra e geralmente vem ao final do processo com a sentença.

            Do gênero tutelas provisórias exsurgem as espécies: tutela provisória de urgência e tutela provisória de evidência. Naquela, pugna-se o inimigo tempo. Nesta, tem-se a probabilidade qualificada. Aqui há um alto grau de probabilidade do direito invocado.

            Nesse diapasão, pontuamos que na tutela antecipada defende-se o  direito material. Se o risco for o comprometimento da utilidade do processo, provocado pelo tempo, servir-se-á da tutela provisória cautelar.  Daniel Amorim Assumpção Neves (2010, p. 314) afirma que “a tutela cautelar garante para satisfazer, e a tutela antecipada satisfaz para garantir”.  Assim, podemos dizer que aquela é satisfativa; esta, assecuratória.  Tanto esta como aquela podem ser antecedentes ou incidentais. Impende observar que a tutela de evidência é sempre satisfativa. Também convém considerar, a teor do art. 300, parágrafo 3º, do CPC/15, que o juiz não concederá a tutela antecipada, se constatar risco de irreversibilidade.

            Somente a tutela provisória satisfativa antecedente tem aptidão para estabilizar-se nos termos do art. 304. Para tanto, deve haver requerimento expresso nesse sentido. Destarte, o réu precisa saber de antemão a intenção do autor. Se o autor expressamente declara a sua opção pelo benefício do art. 303, subentende-se que ele estará satisfeito com a estabilização da tutela antecipada, caso ela ocorra. Isto porque o réu pode, confiando na estabilização, simplesmente aceitar a decisão antecipatória, pois permanecendo inerte terá a vantagem da redução do custo do processo. É um estímulo para que o réu não reaja já que, ainda que a tutela se estabilize nos termos do art. 304, poderá ser reformada ou invalidada por ação autônoma. Uma das grandes novidades trazidas pelo novo CPC acerca do tema é essa possibilidade de estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente.  Assim sendo, serve para abarcar aquelas situações em que ambas as partes se contentam com a simples tutela antecipada, não havendo, em tal caso, necessidade de se prosseguir com o processo até uma decisão final (sentença), pela dicção do art. 304, §§ 1º a 6º, do CPC/2015. Roborando o assunto, segundo o art. 304, não havendo recurso contra a decisão que deferiu a tutela antecipada requerida em caráter antecedente, a  decisão será estabilizada e o processo será extinto, sem resolução de mérito. É sobremodo importante assinalar que no prazo de 2 anos, contado da ciência da decisão que extinguiu o processo, as partes poderão pleitear, perante o mesmo juízo que proferiu a decisão, a revisão, reforma ou invalidação da tutela antecipada estabilizada, devendo se valer de ação autônoma para esse fim. É de se observar, porém, que, embora o caput do art. 304 do CPC/2015 determine que “a tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso”, a leitura que deve ser feita do dispositivo legal, tomando como base uma interpretação sistemática e teleológica do instituto, é que a estabilização somente ocorrerá se não houver qualquer tipo de impugnação pela parte contrária, sob pena de se estimular a interposição de agravos de instrumento, sobrecarregando desnecessariamente os tribunais, além do ajuizamento da ação autônoma, prevista no art. 304, § 2º, do CPC/2015, a fim de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada.

            No que concerne aos requisitos das tutelas de urgência, considera-se a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

            Cônscios somos de que a urgência e evidência são pressupostos para a concessão da tutela provisória. Convém, contudo, pontuar que a tutela da evidência (art 311, CPC/2015), sempre incidente, funda-se apenas na demonstração do óbvio ululante do direito. Prescinde da necessidade de demonstrar urgência. Porquanto, seu fundamento é apenas a evidência (a probabilidade do direito). Trata-se, assim, de uma tutela provisória sem urgência. Não se pode olvidar que ela é sempre satisfativa. Da tutela da evidência preleciona FUX (1996, p. 313):

A evidência toca os limites da prova e será tanto maior quanto mais dispuser o seu titular de elementos de convicção

[...] é evidente o direito cuja prova dos fatos sobre os quais incide revela-o incontestáveis ou ao menos impassíveis de contestação séria.

            A nosso pensar, é o direito comprovado de plano. Assemelha-se ao direito líquido e certo do Mandado de Segurança, ou seja, é um direito cuja base fática possui uma robusta fundamentação probatória, mas sempre em cognição sumária. Evidência fática como direito líquido e certo.

            A teor do art. 311, caput, a tutela da evidência é provimento sumário sem periculum in mora. É o temperamento. A redistribuição do ônus processual. Evidencia-se que o autor tem uma desvantagem temporal, visto que o bem da vida certamente está com o réu e, assim, equaliza-se o ônus temporal.

            Em virtude dessas considerações, indubitável é perceber a relevância do tema em questão, a tutela provisória. Oportuno se torna dizer que é uma maneira de dar efetividade aos princípios da duração razoável do processo, da proporcionalidade e da razoabilidade bem como a redistribuição do ônus processual. Ao ensejo da conclusão da abordagem, adentramos, na presente produção textual, na qualidade da cognição, na urgência, na provisoriedade e na instrumentalidade. Cumpre, por fim, assinalar a previsão de um ulterior provimento definitivo. Não há divórcio entre o provisório e o definitivo.  Pelo contrário, há elementos que os jungem. Provisoriamente já se vislumbra objetivamente o definitivo.

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Referências

 

 

FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela de evidencia: fundamentos da tutela antecipada. São Paulo: Saraiva,, 1996, p. 313

 

Lei 13105/15

 

NEVES,Daniel Amorim Assumpção. Tutela antecipada e tutela cautelar. In:: ARMELIN, Donal et al (org). Tutelas de urgência e cautelares. Estudos em homenagem a Ovídio A. Baptista da Silva. São Paulo: Saraiva, 2010, p 313-332.

 

 

           

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