São João Damasceno
“O jardim da Sagrada Escritura”
Diz o Apóstolo: Muitas vezes e de diversos modos Deus falou outrora por meio dos profetas; mas nestes últimos tempos nos falou por meio do Filho. Por meio do Espírito Santo falaram a lei e os profetas, os evangelistas, os Apóstolos, os pastores e mestres. Por isso, toda Escritura é inspirada por Deus e útil.
É, portanto, coisa bela e salutar investigar as divinas Escrituras. Como uma árvore plantada junto aos cursos d’água, assim a alma regada pela Sagrada Escritura cresce e traz o fruto ao seu tempo; a saber, a fé reta, e está sempre adornada de folhas verdes, isto é, de obras agradáveis a Deus.
Pelas santas Escrituras, de fato, somos conduzidos para cumprir ações virtuosas e para a pura contemplação. Nelas encontramos o estímulo para todas as virtudes, e o afastamento de todos os vícios. Por isso, se aprendemos com amor, aprenderemos muito; pois, mediante o empenho, o esforço e a graça de Deus que dá todas as coisas, obtém-se tudo: aquele que pede, recebe; o que procura, encontra; a quem chama, lhe será aberto.
Exploremos, portanto, este magnífico jardim da Sagrada Escritura, um jardim que é perfumado, suave, repleto de flores, que alegra os nossos ouvidos com o canto de variadas aves espirituais, plenas de Deus; que toca o nosso coração e o consola quando se encontra triste, o acalma quando se irrita, o enche de eterna alegria; que eleva o nosso pensamento sobre o dorso brilhante e dourado da divina pomba, que com suas asas majestosas nos leva até o Filho unigênito e herdeiro do Senhor da vinha espiritual, e por meio dele ao Pai das luzes. Porém, não o exploremos desanimados, mas com ardor e constância; não nos cansemos de explorá-lo. Deste modo ele nos será aberto.
Se lermos uma vez ou outra uma passagem e não a compreendemos, não desanimemos; pelo contrário, temos de insistir, refletir, interrogar. De fato, está escrito: interroga a teu pai e ele te contará, aos teus anciãos e eles te dirão. A ciência não é coisa de todos.
Vamos à fonte deste jardim para tomar as águas puríssimas e perenes que brotam para a vida eterna. Gozaremos e nos saciaremos, sem saciar-nos, porque sua graça é inesgotável. Se podemos tomar algo de útil também dos profanos, nada nos proíbe; porém, comportemo-nos como expertos cambistas, que recolhem o ouro genuíno e puro, enquanto rejeitam o ouro falso.