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O LADRÃO DO PARAÍSO

São João Crisóstomo (c. 345-407)
presbítero de Antioquia, bispo de Constantinopla, doutor da Igreja
Homilia 1 sobre a cruz e o ladrão, para Sexta-feira Santa, 2; PG 49, 401


Quando vieres com a tua realeza


"Abriu-se hoje para nós o paraíso, fechado há milhares de anos; neste dia, nesta hora, Deus introduziu nele o ladrão. Realizou assim duas maravilhas: abriu-nos o paraíso e fez entrar nele um ladrão. Hoje, Deus devolveu-nos a nossa pátria, reconduziu-nos à cidade dos nossos pais, abriu uma morada comum a toda a humanidade. «Hoje estarás comigo no Paraíso». Que dizes, Senhor? Estás crucificado, cravado com pregos, e prometes o Paraíso? Sim, diz Ele, para que, pela cruz, conheças o meu poder. […]
Não foi por ressuscitar um morto, por dominar o mar e o vento nem por expulsar os demónios que Ele conseguiu transformar a alma pecadora do ladrão, mas por ter sido crucificado, preso com pregos, coberto de insultos, de escarros, de troças e de ultrajes, para que tu conhecesses os dois aspetos do seu poder soberano: Ele fez tremer a criação e fendeu os rochedos (Mt 27,51); e atraiu a Si a alma do ladrão, mais dura do que a pedra, revestindo-a de honra. […]
Jamais rei algum permitiria, ao entrar soberanamente na cidade do seu reino, que um ladrão ou qualquer outro súdito se sentasse a seu lado. Mas Cristo fê-lo: ao entrar na sua santa pátria, levou consigo um ladrão. Agindo deste modo […], não a desonra com a presença de um ladrão; bem pelo contrário, honra o Paraíso, porque é uma glória para o Paraíso que o seu Senhor torne um ladrão digno das delícias que ali se saboreiam. De igual modo, quando faz entrar os cobradores de impostos e as meretrizes no Reino dos Céus (Mt 21,31) […], fá-lo para glória desse lugar santo, mostrando assim que o Senhor do Reino dos Céus é tão grande que pode restituir a dignidade às meretrizes e aos cobradores de impostos, de maneira que estes se tornam merecedores de tal honra e de tal dom. Admiramos um médico quando o vemos curar homens que padecem de doenças consideradas incuráveis. É portanto justo que admiremos a Cristo […] quando O vemos devolver aos cobradores de impostos e às meretrizes tal santidade espiritual que se tornam dignos do Céu."

-No Calvário há muitos desiludidos e apenas um com esperança. O mais inesperado dos intervenientes, sentenciado à morte por ser malfeitor, único a chamar Jesus pelo nome. Só ele vê a nova realeza que Jesus encarna: a realeza que é serviço, a realeza de Deus que salva. E pede. Não quer usar Jesus em proveito próprio. Pede com a humildade de quem confia. De quem descobriu o maior tesouro. Nele reconhecemos os que parecem irremediavelmente perdidos aos olhos de muitos, os que parecem não ter futuro, os que são descartados e postos à margem. Ele lembrar-nos-á a esperança além de toda a esperança. S. João Crisóstomo dirá que ele “roubou o paraíso”: “Ninguém antes dele ouviu uma promessa semelhante […] O ladrão entrou à frente deles todos. Mas também a sua fé ultrapassou a deles. […] Ó admirável malfeitor! Viste um homem crucificado, e proclamaste-o Deus!”

 O “hoje” que Jesus ofereceu na cruz não foi só para o “bom ladrão”. É para todos, no “hoje” das nossas vidas, sempre que nos enchemos de misericórdia para dar a alguém. Não há filas de espera, nem senhas numeradas, nem prazos a cumprir no paraíso que Deus quer dar “hoje”. 

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