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A TUTELA DA CONFIANÇA por Edson Lira, advogado

 O princípio da confiança legítima tutela a permanência de atos cujos efeitos, por terem  delongas no tempo, provocaram nas partes uma expectativa legítima de continuidade. É comum que uma parte realize um planejamento em conformidade com o contratado, bem como em consonância com as declarações e comportamentos adotados pelo outro envolvido na relação jurídica, de tal forma que se acontecer alguma alteração inesperada ou prática de uma ação contraditória pelo outro, deve o prejudicado ser reparado em consideração à confiança por ele previamente depositada.

A tutela da confiança visualiza a necessidade de se estabilizar as relações jurídicas existentes entre as partes contratantes, dotando-as de previsibilidade, ingrediente indispensável à constituição de uma ordem jurídica, pois possibilita o acolhimento das expectativas legitimamente criadas.
Deter-nos-emos, assim, no trabalho trazido à baila no princípio da confiança, gerador de legítima expectativa. O contrato é permeado pela confiança.  O princípio da confiança oferece um conteúdo ao venire. Assim sendo analisaremos o princípio da confiança como fundamento do venire contra factum proprium no fenômeno obrigacional. Cônscios estamos que o princípio da confiança oferece um conteúdo mais preciso ao venire. Existe, porquanto, uma subordinação fundamental e funcional da proibição do comportamento contraditório ao princípio da confiança, confiança e coerência.
Se, por um lado, defende-se a flexibilidade, visto que a rigidez é cadavérica, por outro lado, pondera-se que o ser humano é um ser ético, debruça-se sobre si mesmo, produz interdições e busca a coerência. Se essa é buscada, a incoerência é reprovada, porquanto é geradora de frustração na parte decepcionada pelo comportamento contraditório. Se hoje é sim, amanhã é não, o que é afinal? É sim? É não? Em uma apertada síntese, percebe-se a necessidade da coerência com o propósito de haver segurança nas relações humanas.
A proibição do comportamento contraditório visa a coibir comportamentos opostos que se repelem entre si. Um é a negação do outro. Trata-se da análise de dois comportamentos, diferidos no tempo, imputáveis a uma mesma pessoa. Em si mesmo cada comportamento é lícito. A contradição evidencia-se quando se colocam os comportamentos um em relação ao outro. O comportamento primevo (factum  proprium) torna-se gerador de uma expectativa de manutenção do comportamento O sucessivo comportamento será  inicialmente coerente com o primeiro. Se o contrário ocorrer verificar-se-á a contradição, rechaçada pelo princípio da confiança, pela boa-fé objetiva.
A aplicação do princípio do venire contra factum proprium traz segurança e credibilidade às relações sociais e jurídicas, onde os contratantes mantêm um comportamento coerente e leal, como um princípio básico de convivência social, evitando assim, causar prejuízos às expectativas despertadas em outrem.
Contemplaremos a teoria dos atos próprios Vale ressaltar que a teoria dos atos próprios é gênero que como espécies podemos indicar, entre outros institutos, o venire contra factum proprium, a surrectio e supressio. Assim sendo, essa teoria desmembra-se em outros institutos. Todos esses institutos são axiologicamente justificados pela função social e pela vedação do abuso de direitos.
Ainda que os seres humanos vivam em dissenso, urge a consideração de uma espécie de código de ética mínimo, sem o que a qualidade de ser humano se esvai. A solidariedade, a cooperação e o respeito devem ser presentes. Não se deve subestimar a racionalidade do outro.
Em qualquer atividade humana convém indagar: é ético efetivar tais práticas? A atividade humana precisa orientar-se por critérios e referenciais éticos para estarem teleologicamente voltada para o “bem” e não implodir a própria existência humana. Indubitavelmente o bem primeiro do agir humano é o próprio ser humano.

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